quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

DURANTE O FIM  de João Trabulo



O filme “durante o fim” do realizador português João Trabulo não lança seu olhar apenas ao estonteante universo do escultor Rui Chafes, nem somente ao seu discurso. Ele nos envolve, durante seus 70 minutos de projeção, numa experiência sensorial e reflexiva sobre o fazer artístico. É através da sensibilidade inerente aos dois artistas que as imagens se constroem.

O realizador João Trabulo possui um grande fascínio pela obra do  escultor Rui Chafes, e já confessou inúmeras vezes o quanto o trabalho deste colaborou em sua formação artística. Era natural que ao realizar o filme, João fosse ao encontro do que procurava de forma muito respeitosa e humilde, fazendo de “durante o Fim” uma obra conjunta, uma extensão do trabalho de Chafes.




Das conversas sobre “o filme que não queríamos fazer” como diz Trabulo, eles chegaram a forma de como o universo ideológico e filosófico do artista poderia ser traduzido. Através de suas indagações artísticas, de seu diário íntimo de processo criativo e de outras obras que influenciavam e que dialogavam com o seu trabalho. Várias áreas artísticas que se concentravam na escultura de Chafes vieram à tona.




O filme “Andrei Rublev” de Andrei Tarkovski e "Heinrich" , de Helma Sanders-Brahams são um exemplo disso. Trabulo vai permear a película com momentos dessas duas obras que se correlacionam ao universo íntimo de Chafes. Seja no tempo, na contemplação, no silêncio de Tarkovski, bem como na angustia do próprio pintor Rublev em relação a sua arte. Ainda no romantismo alemão de Heinrich, temos o encontro com a natureza, o passeio pela floresta e a certeza da morte. Em um de seus discursos durante o filme, Chafes fala sobre essa perda eterna, a relação desta com sua obra e ainda afirma “a arte só fala da morte”.

Durante três anos seguindo Chafes, Trabulo soube enquadra-lo percebendo como o artista funcionava. No contraste de sons entre a floresta e o atelier, na escuridão do cinema e na projeção das sombras oriundas das faíscas de sua produção artística, no paradoxo entre a leveza que emanava de suas obras e do pesado ferro, sua matéria prima.



Ao investigar o fazer artístico e sua concepção, o tempo necessário para a manufatura de uma escultura em ferro e toda a idealização em torno desse processo de trabalho, Trabulo nos presenteia com uma obra ímpar, cheia de poesia e reflexões que nos permitem não apenas compreender o fazer artístico do escultor mas também sentir profundamente sua arte.


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