Time Capsule
A Revista ASPEN, 1965 — 1971
Em 1965, a editora norte-americana Phyllis Johnson decidiu iniciar um projecto editorial que
pretendia, nas suas próprias palavras, ser um termómetro do seu tempo. Aspen, onde se
encontrava quando o projecto começou a ser concebido, era uma estância turística que se tinha
vindo a desenvolver desde 1945, sobretudo pela mão do empresário Walter Paepcke,
em torno de uma ideia de design largamente influenciada pela Bauhaus.
O desenvolvimento da Aspen e a proeminência da cultura arquitectónica que os Paepcke
recolheram na colaboração com Walter Gropious e Herbert Bayer, viriam a conduzir a um
programa de dinamização cultural da pequena cidade mineira, transformada em estância
de luxo e epítome de uma visão cultural que produziu a Goethe Bicentennial Convocation
and Music Festival, em 1949, acolhida numa tenda desenhada para o efeito por Eero Saarinen.
A cidade desenvolver-se-ia num cruzamento entre uma ideia setecentista europeia de cultura
e a atracção das classes mais altas pelos desportos de Inverno. Seria ainda este ambiente
que tornaria Aspen, pela mão de Herbert Bayer, no lugar ideal para o desenvolvimento da
Conferência Internacional de Design [IDCA] em 1965.
É a partir deste ambiente que Phyllis Johnson concebe a revista Aspen, acessível só por assinatura, da qual viriam, entre 1965 e 1971, a ser publicados apenas 10 números.
"We wanted to get away from the bound
magazine format, which is really quite
restrictive."
Phyllis Johnson
A ideia de publicação como uma caixa dentro da qual viriam inúmeros materiais
[brochuras, postais, cartazes, discos e mesmo filmes] está ligada a uma experiência
de fruição colectiva, em grupo, própria das transformações culturais da década de 1960.
Cada número da revista teve um editor e designers diferentes, ainda que por vezes
as mesmas pessoas acumulavam ambas as tarefas.
Os dois primeiros números da revista estavam ainda muito ligados ao ambiente da
estância de Aspen, à sua arquitectura e frequência social. A partir do número #3 e
até ao número #9, a Aspen transformou-se num espelho das tendências mais inovadoras
da cultura emergente à época, sobretudo centrada no ambiente e nas polémicas do
universo artístico, a que se juntaria a influência tutelar de Marshall McLuhan.
Cada número da Aspen é portanto um testemunho vivo de um tempo, quer nos conteúdos
publicados, quer no design — sendo hoje particularmente estimulante compreender
a importância posterior de alguns dos designers envolvidos, à cabeça dos quais está
Quentin Fiore.
Aspen #1 e #2
No primeiro número da revista, concebido e desenhado por George Lois, Tom Courtos
e Ralph Tuzzo, está vinculada uma visa cultural da estadia de Aspen. O design sofisticado
percorre os vários itens, onde se encontra uma brochura sobre jazz, comparando
o jazz moderno e o clássico, inclui também um flexidisc com gravações de Bill Evans
e St. James Infirmary Blues, um standard dos blues.
O #2, desenhado por Frank Kirk e Tony Angotti segue a mesma tipologia, incluindo também
um registo fotográfico de Scriabin e uma brochura sobre a Aspen Film Conference, no qual
são reproduzidos excertos de dezassete conferências.
Aspen #3
Fundamental na viragem editorial da Aspen, o terceiro número foi editado e
desenhado por Andy Warhol e David Dalton. Constitui um fresco da Pop Art americana
da década em 1966, com contribuições de Gerard Malanga, Lou Reed, John Cale,
a presença tutelar dos Velvet Underground e a memória da Conferência realizada em
Berkley sobre LSD, para além de um resumo da Pop Art na colecção de Thomas Powers
através de doze postais comentados pelos artistas. Inclui ainda uma publicação
introdutória ao projecto performativo de multimédia Explosion Plastic Inevitable, resultado
da colaboração entre os Velvet Underground, Andy Warhol e Nico.
Aspen #4
Esta edição é fundamental para qualquer compreensão das transformações culturais deste período. Concebido e desenhado por Marshall MacLuhan e Quentin Fiore, remete para toda uma teoria sobre design e semiótica. As contribuições de John Cage, a publicação de registos fotográficos de Mario Davidovsky e Daniel Kunin, as reflexões de Bob Chamberlain sobre a cultura motociclista da América, o sumptuoso design da brochura sobre a cegueira e a deambulação constituem marcos fundamentais.
Aspen #5+6
O número duplo numa caixa concebida por Brian O’Doherty é um dos mais importantes
exemplares da revista. Tomado como o número Minimal, remete para uma abordagem
analítica da prática artística, um recuo histórico em direcção aos possíveis fundamentos,
em Duchamp e no movimento Dada, das segundas vanguardas e um passo em direcção
à performatividade. As colaborações de David Smith, Dan Graham, Brian O’Doherty,
para além dos registos fonográficos, transformam este número da revista numa peça
bibliográfica excepcional que permite reequacionar as relações históricas entre as primeiras
e segundas vanguardas.
Aspen #6A
Este número excêntrico em relação à produção da Aspen consiste num repositório
das folhas de sala dos eventos performativos que tiveram lugar na Judson Gallery nos
anos de 1967 e 1968, com contribuições de Nam June Pais, Carolee
Schneemann, Allan Kaprow e outros.
Aspen #7
Dedicado à arte e cultura británicas foi editado por Mario Amaya, um influente crítico
à época dos EUA e desenhado por John Kosh, director criativo da Apple Records e designer
da capa Abbey Road, dos Beatles.
O número possui importantes contribuições de Peter Blake, bem como de John Lennon e
Yoko Ono, pretendendo ser uma revisão da cultura Pop Britânica, presente nas imagens,
no design e nos registos fonográficos.
Aspen #8
Normalmente conhecido por número Fluxus, desenhado por George Maciunas, o fundador
do movimento Fluxus nos EUA, encontra-se muito próximo do panorama pós-minimal.
Editado por Dan Graham, é um repositório do pensamento pós-conceptual na arte americana,
com contribuições de Eleanos e David Antin, Jo Baer, Philip Glass, La Monte Young e outros.
Aspen #9
O psicadelismo é o tema deste número da Aspen concebido e editado por Hetty e
Angus McLise, primeiro percussionista dos Velvet Underground e figura prematuramente
desaparecida. Com colaborações musicais com La Monte Young e Marian Zazeela,
e também John Cale e Terry Riley, Angus MacLise concebeu um número que
mergulha nas filosofias orientais e na poesia psicadélica.
Aspen #10
O último número da Aspen, bastante raro, é dedicado ao Oriente — China, Índia
e Nepal. De certa forma é uma continuação do fascínio pelo Oriente do número anterior,
mas convertido à história da Arte. O volume possui contribuições de Gary Snyder,
poeta da beat generation e Allen Atwell, artista plástico.
O número faz um percurso pela arte da Índia e China, com textos históricos que
enquadram as imagens reproduzidas.
http://www.ubu.com/aspen/
http://www.culturgest.pt/arquivo/2017/expos/time-capsule.html
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