segunda-feira, 5 de março de 2018

Metamodernismo                                               
                                               Com, entre, para além do modernismo.

                                               “Os anos pós-modernos de abundância,
                                                    pastiche e parataxes acabaram.”

O metamodernismo é um termo que tem ganhado alguma tração nos últimos anos e que visa compreender um conjunto de avanços filosóficos, estéticos, culturais e sociais da contemporaneidade e que surgem como reação ao pós modernismo. Se tivermos em conta a miríade de académicos, críticos e eruditas cujos livros e artigos descrevem o declínio e desaparecimento do pós-modernismo, concluímos que estamos numa mudança de paradigma. Na viragem do século, as mudanças climáticas, as crises financeiras e o escalar de conflitos armados começaram a germinar uma consciência atenta e global, com necessidades palpáveis e desejos de uma mudança que fosse para além de um “Fim da História”, proclamado (prematuramente) em 1992 por Fukuyama. Hoje, não parece que estejamos no ponto final da evolução ideológica da humanidade, porém, é difícil perceber onde estamos afinal.
Oscilando entre o entusiasmo moderno e a ironia pós-moderna, em 2010, dois teóricos culturais, Timotheus Vermeulen e Robin van den Akker propuseram o metamodernismo como uma intervenção no debate pós-pós-modernista. Neste âmbito, eles argumentam que temos vindo a assistir a um regresso a valores e posições de carácter moderno, mantendo um distanciamento tipicamente pós-modernista. Aparentemente contraditório, é precisamente neste equilíbrio que este discurso se balanceia.
Em 2011, o artista inglês Luke Turner, procurando resumir o espírito meta-modernista pública O Manifesto Meta-modernista, 8 pontos que servem de “reação romântica ao nosso momento repleto de crises”.

1. We recognise oscillation to be the natural order of the world.


O primeiro contorno desta estrutura é caracterizada pela oscilação entre um compromisso tipicamente moderno e um distanciamento marcadamente pós-moderno. O metamodernismo é oscilação. O prefixo Grego "meta" refere-se exatamente a noções como "com", "entre" ou "para além de". Vermeulen e van der Akker escrevem em Notes on Metamodernism (2010) que situam o metamodernismo de várias formas: epistemologicamente com o pós-modernismo, ontologicamente entre o (pós) modernismo e historicamente além do (pós) modernismo.


 
 
2. We must liberate ourselves from the inertia resulting from a century of modernist ideological naivety and the cynical insincerity of its antonymous bastard child.

O cinismo como escola de pensamento da Grécia antiga surge como uma possibilidade de felicidade individual e em sociedade numa era de incerteza e ideologicamente cataclísmica. O cinismo doutrina que a eudaimonia, estado de felicidade ou “crescimento humano” é atingível quando o homem vive em comunhão com a Natureza, servindo-se sempre da razão para julgar as suas ações. A Eudamonia surge da apatheia (equanimidade), arete (virtude moral), filantropia, parrhesia (franqueza) e também da indiferença para os acasos e vicissitudes da vida. Envolvido numa vida de crescimento espiritual, o cínico torna-se no homem na Natureza, onde o materialismo, a riqueza, a fama e o poder deixam de fazer sentido.
Por outro lado, ao homem meta moderno, cabe-lhe libertar-se da inércia do conforto do pessimismo existencial. O cinismo já não é uma atitude válida perante a condição humana. O homem não pode somente aceitar a sua condição, deverá atravessa-la com as ferramentas de que dispõe.





3. Movement shall henceforth be enabled by way of an oscillation between positions, with diametrically opposed ideas operating like the pulsating polarities of a colossal electric machine, propelling the world into action.

É no confronto que surge ação. O pós-modernismo era uma resposta direta ao modernismo, por isso, as duas filosofias debatem pontos de vista diametralmente opostos. O metamodernismo aparece como um negociador bastante optimista e que crê que os dois pontos de vista não são mutuamente exclusivos e, que na verdade, os dois operam simultaneamente seja num indivíduo ou num grupo.

4. We acknowledge the limitations inherent to all movement and experience, and the futility of any attempt to transcend the boundaries set forth therein. The essential incompleteness of a system should necessitate an adherence, not in order to achieve a given end or be slaves to its course, but rather perchance to glimpse by proxy some hidden exteriority. Existence is enriched if we set about our task as if those limits might be exceeded, for such action unfolds the world.

Tal como no absurdismo de Albert Camus, o meta-modernismo compreende a condição humana e opera dentro dos seus limites. É dentro do espírito humano que existe o absurdo. Contudo, “é preciso imaginar Sísifo feliz”, pois a hora da desgraça é a hora da consciência. Precisamos de ser mais fortes que o nosso rochedo pois o próprio ato de enfrentar o nosso destino é valoroso e eleva o nosso espirito.

5. All things are caught within the irrevocable slide towards a state of maximum entropic dissemblance. Artistic creation is contingent upon the origination or revelation of difference therein. Affect at its zenith is the unmediated experience of difference in itself. It must be art’s role to explore the promise of its own paradoxical ambition by coaxing excess towards presence.

As leis de entropia do universo ditam que operamos  num sistema do qual a criação artística faz parte. Numa analogia de Jake Clark para a webgazine Metamodernism, se o modernismo era a crença absoluta na construção de Babel, e o pós-modernismo foi a constatação de que não podia ser construída, o meta-modernismo pode ser considerada a vontade de começar a sua construção com o conhecimento de que é uma tarefa deficiente ou inatingível.
Hoje em dia, o artista ou o designer envolvem-se num novo tipo de projeto que se tem vindo a chamar de “design fiction”; projetos onde as trends de des-especialização e de projetos  não comissionados permitem que se crie a ideia de artistas “amadores profissionais”. Artistas que admitem que o seu trabalho seja uma “tentativa”, independentemente dos resultados que venham dele. Esta “estrutura de sentimento” tem características inequivocavelmente “metaciais”. Não há nada de inerentemente amador nesta abordagem à arte e, em especial, ao design - que pode é por vezes mais facilmente rotulada por uma simples procura pelas formas visuais - e que negligencia absolutamente o “designer pensador”.

6. The present is a symptom of the twin birth of immediacy and obsolescence. Today, we are nostalgists as much as we are futurists. The new technology enables the simultaneous experience and enactment of events from a multiplicity of positions. Far from signalling its demise, these emergent networks facilitate the democratisation of history, illuminating the forking paths along which its grand narratives may navigate the here and now.

A democratização da história é um pensamento bonito que se torna possível com as novas tecnologias. Um mundo cada vez mais Informado é um mundo que pode evoluir lado a lado consigo mesmo, onde a ação é reação e a reação é ação. O caminho ilumina-se porque se percorre a si próprio à medida que se cria. O momento é oportuno à criação de um mapa cognitivo do nosso presente, e têm existido eventos nesse sentido. A História não acabou e até Fukuyama haveria de escrever, em 2012, “O Futuro da História”, admitindo que, em retrospectiva, se teria precipitado. Vários fenómenos recentes estão a redesenhar o nosso percurso neste momento chave da humanidade. Também é com certeza que dizemos que a vitória das democracias liberais não foi tão espectacular como se fazia ser.  As promessas não foram compridas, as crises sobrepuseram-se ao crescimento, o extremismo político prevalece cada vez mais e a classe média, motor da sociedade democrática, desaparece no ar. Também o aquecimento global, a nova era de informação digital e outras questões como a sobre-população demonstram que, afinal, a História continua. Entre o seu fim e regresso, uma geração nasceu e aprendeu a viver num mundo incerto. É uma geração confiante e confusa, assertiva e ansiosa, isolada e conectada, nostálgica e futurista.
 



7. Just as science strives for poetic elegance, artists might assume a quest for truth. All information is grounds for knowledge, whether empirical or aphoristic, no matter its truth-value. We should embrace the scientific-poetic synthesis and informed naivety of a magical realism. Error breeds sense.



8. We propose a pragmatic romanticism unhindered by ideological anchorage. Thus, metamodernism shall be defined as the mercurial condition between and beyond irony and sincerity, naivety and knowingness, relativism and truth, optimism and doubt, in pursuit of a plurality of disparate and elusive horizons.


We
must
go
forth
and
oscillate!

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