sábado, 5 de dezembro de 2015

Reflexão Crítica sobre o 16º Congresso Português de Arte-Terapia

Reflexão Crítica sobre o 16º Congresso Português de Arte-Terapia


              Nos passados dias 24 e 25 de Outubro de 2015, decorreu o 16º Congresso Português de Arte-Terapia|Psicoterapia (1º Congresso Português Inter-Psicoterapias), organizado pela Sociedade Portuguesa de Arte-Terapia (SPAT), na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, sob a temática “O Estado da Arte – Psicoterapias em Portugal” (ver Fig. 1). 
Fig. 1 - Cartaz oficial do 16º Congresso Português de Arte-Terapia
Fonte: http://arte-terapiadanielamartins.blogspot.pt/


            Ao longo das diversas comunicações que aconteceram durante estes dois dias, foi possível não só, adquirir conhecimentos e noções básicas de vários conceitos e definições subjacentes ao exercício da Arte-terapia e da Psicoterapia – desde a identidade e o reconhecimento do eu/self em contato e na relação de semelhança/diferença com o outro, a psicanálise e a origem e as influências do outro ao longo da vida do indivíduo, vínculo/relacionamento interpessoal no grupo onde o indivíduo está inserido e com o terapeuta/mediador, as finalidades e estratégias de intervenção da arte-terapia, entre outros –  , como também reconhecer a prática da Arte-terapia e os seus benefícios e resultados alcançados e observáveis, em contextos e junto de públicos-alvo diversos, como a população idosa, indivíduos com esquizofrenia, surdez ou síndrome de Asperger.
            A atual sociedade numa era em que a globalização e a divulgação da informação atingem proporções exponenciais, as novas tecnologias e a evolução da ciência e da medicina associada a esta fenómeno (quase) universal; uma atual sociedade em constante contato com as atividades industriais, comerciais e dos serviços, distanciada do mundo natural, onde a poluição, a falta de tranquilidade, a dependência socioeconómica do “relógio” e da sua própria rotina diária levam a problemáticas e consequências associadas à falta de tempo e de atenção, desde o stress, mau estar, sofrimento psíquico e depressão, síndromes metabólicas – incluindo a obesidade, hipertensão arterial e perturbações metabólicas. Assistimos a indivíduos cada vez mais fechados em si mesmos, consumistas e materialistas, com o desejo de poder, de competir, de se tornar o ser perfeito e genial que, frequentemente, são incapazes de encontrar um sentido na vida ou de se identificar com a organização/elite social, desencandeando a infelicidade e o “adoecimento”, procurando a via da medicalização para resolver os seus problemas e traumas. Porém, é de extrema importância que se compreenda que, muitas vezes, a saúde dum indivíduo não pode ser resolvida fora do contexto social.
A Arte-terapia é vista como uma ferramenta potenciadora da criatividade e do desenvolvimento pessoal, em que através do criar e do processo criativo, o indivíduo consiga exprimir-se através das cores e das formas, aceder a um espaço onde tem lugar o jogo entre a realidade interior (o eu, o self) e o exterior (o outro, o grupo, a sociedade onde está inserido). O exercício da criatividade não cura as doenças, mas pode amenizar a dor e trazer a tranquilidade e a sensação de bem estar e de relaxamento a quem pratica a arte, independentemente da sua expressão artística (pintura, dança, música, teatro, entre outros). A utilização das artes generalizou-se na sociedade, seja como forma de ocupação de tempos livres como em contextos hospitalares, de saúde e institucionais, tendo como resultado a “arte bruta”, ou seja, inúmeros trabalhos feitos por pessoas excluídas, quer a nível socioeconómico ou a nível cultural.
        Deste modo, foi possível comprovar os benefícios da arte como terapia com alguns casos práticos e reais, trazidos por alguns oradores e terapeutas: na presença da síndrome de Asperger (definida como uma perturbação neurocomportamental da base genética e uma disfunção com origem num funcionamento cerebral particular) – sendo caraterísticas mais comuns a dificuldade na interação social, na relação com o outro, a incompreensão pelo outro, a falta de expressão facial e uma imaginação muito fértil dentro do seu Universo – , com a prática de várias formas mediadoras artísticas (desenho, pintura, dança, modelagem, expressão dramática e escrita livre), o indivíduo é convidado a representar o que sente e o que o “outro” sente, o seu próprio mundo de forma tridimensional e a expandir as suas capacidades motoras e cognitivas, tendo como resultados a partilha das criações com o outro e uma respetiva interação social mais cuidada e o sorriso como expressão facial. A intervenção da Arte-terapia com idosos – um público vulnerável caraterizado por uma baixa auto-estima e valorização, com sentimento de inutilidade e que não tem nada para dar ou oferecer – permitiu que estes se sentissem mais confiantes em relação ao seu próprio trabalho desenvolvimento, com maior capacidade de iniciativa e de autonomia, quer no “fazer artístico” como também perante a sua vida. Outro caso prático apresentado foi a intervenção da Arte-terapia na presença da Psoríase (doença crónica de pele complexa que, através de interações biológicas, psicológicas e sociais, a vida emocional afeta o sistema orgânico, assim como o sistema orgânico afeta a vida emocional), em que os fatores associados a esta patologia – dificuldades do dia-a-dia no processo de comunicar com o outro, tristeza, agressividade, responsabilidade pela doença e quadros depressivos e corrosivos – eram minimizados através da prática da Arte-terapia, possibilitando a expressão por meio de imagens e colmatando as dificuldades de comunicação, a afirmação e o reconhecimento de um espaço terapêutico e de criação de novas dinâmicas relacionais e de integração, e o uso da criatividade como estratégia de resolver situações.
A Arte-terapia proporciona um espaço destinado à criatividade artística num contexto relacional e facilitador do desenvolvimento do paciente/indivíduo. A arte é, desta forma, vista como um exercício de racionalidade, sensibilidade, emoção e exercício cognitivo, levando a um sentimento de pertença ao mundo, a si mesmo e ao “outro”. Ao contrário de outros países como o Brasil, a Inglaterra ou o Canadá, o arte-terapeuta ainda não é uma profissão reconhecida em Portugal, sendo necessário fomentar o inter-enriquecimento mútuo, validando uma identidade comum, inerente a uma prática com a finalidade afim que define um exercício profissional, tal como os artistas são os profissionais da Arte, independentemente se desenvolvem o cubismo, o surrealismo ou o dadaísmo.
Num ponto de vista mais pessoal e tendo em conta a minha formação académica de base em Animação Sociocultural, considerei este congresso e as temáticas aqui abordadas e desenvolvidas de extrema importância e pertinência, na medida em que as Artes são formas e mediadores de expressão cultural que podem, por um lado, desenvolver a comunicação (verbal e não verbal) e a identidade/forma de expressão do próprio indivíduo espontaneamente com e para o “outro”, assim como aproxima e reconhece diferentes manifestações culturais e artísticas que nos identificamos na semelhança e diferença com o “outro”, sem esquecer todos os benefícios inerentes à prática das artes e que foram aqui nomeadas ao longo desta reflexão.


Referências Bibliográficas
·      APSA – Associação Portuguesa de Síndrome de Asperger. (2015). O que é a Síndrome de Asperger? Consultado a 30 de novembro de 2015, em: http://www.apsa.org.pt/sindrome-de-asperger/o-que-e
·   PSO Portugal – Associação Portuguesa da Psoríase. (2015) Psoríase – O que é? Consultado a 30 de novembro de 2015, em: http://www.psoportugal.pt/live/page_reader.php?p=301&t=TyBxdWUgw6k/&g=UHNvcsOtYXNl

·      Sociedade Portuguesa de Arte-Terapia. (s.d.). 16º Congresso Português de Arte-Terapia | Psicoterapia. Consultado a 30 de novembro de 2015, em: http://arte-terapia.com/congresso/

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