Reflexão Crítica sobre o 16º
Congresso Português de Arte-Terapia
Nos passados dias 24 e 25 de Outubro de 2015, decorreu o
16º Congresso Português de Arte-Terapia|Psicoterapia (1º Congresso Português
Inter-Psicoterapias), organizado pela Sociedade Portuguesa de Arte-Terapia
(SPAT), na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, sob a temática “O Estado da
Arte – Psicoterapias em Portugal” (ver Fig. 1).
Fig. 1 - Cartaz oficial do 16º Congresso Português de Arte-Terapia
Fonte: http://arte-terapiadanielamartins.blogspot.pt/
Ao longo das diversas comunicações
que aconteceram durante estes dois dias, foi possível não só, adquirir conhecimentos
e noções básicas de vários conceitos e definições subjacentes ao exercício da Arte-terapia
e da Psicoterapia – desde a identidade e o reconhecimento do eu/self em contato e na relação de
semelhança/diferença com o outro, a psicanálise e a origem e as influências do
outro ao longo da vida do indivíduo, vínculo/relacionamento interpessoal no
grupo onde o indivíduo está inserido e com o terapeuta/mediador, as finalidades
e estratégias de intervenção da arte-terapia, entre outros – , como também reconhecer a prática da Arte-terapia
e os seus benefícios e resultados alcançados e observáveis, em contextos e
junto de públicos-alvo diversos, como a população idosa, indivíduos com
esquizofrenia, surdez ou síndrome de Asperger.
A atual sociedade numa era em que a
globalização e a divulgação da informação atingem proporções exponenciais, as
novas tecnologias e a evolução da ciência e da medicina associada a esta
fenómeno (quase) universal; uma atual sociedade em constante contato com as
atividades industriais, comerciais e dos serviços, distanciada do mundo
natural, onde a poluição, a falta de tranquilidade, a dependência socioeconómica
do “relógio” e da sua própria rotina diária levam a problemáticas e
consequências associadas à falta de tempo e de atenção, desde o stress, mau
estar, sofrimento psíquico e depressão, síndromes metabólicas – incluindo a
obesidade, hipertensão arterial e perturbações metabólicas. Assistimos a
indivíduos cada vez mais fechados em si mesmos, consumistas e materialistas,
com o desejo de poder, de competir, de se tornar o ser perfeito e genial que,
frequentemente, são incapazes de encontrar um sentido na vida ou de se
identificar com a organização/elite social, desencandeando a infelicidade e o
“adoecimento”, procurando a via da medicalização para resolver os seus
problemas e traumas. Porém, é de extrema importância que se compreenda que,
muitas vezes, a saúde dum indivíduo não pode ser resolvida fora do contexto
social.
A Arte-terapia é vista como uma ferramenta potenciadora da criatividade
e do desenvolvimento pessoal, em que através do criar e do processo criativo, o
indivíduo consiga exprimir-se através das cores e das formas, aceder a um
espaço onde tem lugar o jogo entre a realidade interior (o eu, o self) e o exterior (o outro, o grupo, a
sociedade onde está inserido). O exercício da criatividade não cura as doenças,
mas pode amenizar a dor e trazer a tranquilidade e a sensação de bem estar e de
relaxamento a quem pratica a arte, independentemente da sua expressão artística
(pintura, dança, música, teatro, entre outros). A utilização das artes
generalizou-se na sociedade, seja como forma de ocupação de tempos livres como
em contextos hospitalares, de saúde e institucionais, tendo como resultado a
“arte bruta”, ou seja, inúmeros trabalhos feitos por pessoas excluídas, quer a
nível socioeconómico ou a nível cultural.
Deste modo, foi possível comprovar
os benefícios da arte como terapia com alguns casos práticos e reais, trazidos
por alguns oradores e terapeutas: na presença da síndrome de Asperger (definida
como uma perturbação neurocomportamental da base genética e uma disfunção com
origem num funcionamento cerebral particular) – sendo caraterísticas mais
comuns a dificuldade na interação social, na relação com o outro, a
incompreensão pelo outro, a falta de expressão facial e uma imaginação muito
fértil dentro do seu Universo – , com a prática de várias formas mediadoras
artísticas (desenho, pintura, dança, modelagem, expressão dramática e escrita
livre), o indivíduo é convidado a representar o que sente e o que o “outro”
sente, o seu próprio mundo de forma tridimensional e a expandir as suas
capacidades motoras e cognitivas, tendo como resultados a partilha das criações
com o outro e uma respetiva interação social mais cuidada e o sorriso como
expressão facial. A intervenção da Arte-terapia com idosos – um público vulnerável
caraterizado por uma baixa auto-estima e valorização, com sentimento de
inutilidade e que não tem nada para dar ou oferecer – permitiu que estes se
sentissem mais confiantes em relação ao seu próprio trabalho desenvolvimento,
com maior capacidade de iniciativa e de autonomia, quer no “fazer artístico”
como também perante a sua vida. Outro caso prático apresentado foi a
intervenção da Arte-terapia na presença da Psoríase (doença crónica de pele
complexa que, através de interações biológicas, psicológicas e sociais, a vida
emocional afeta o sistema orgânico, assim como o sistema orgânico afeta a vida
emocional), em que os fatores associados a esta patologia – dificuldades do
dia-a-dia no processo de comunicar com o outro, tristeza, agressividade, responsabilidade
pela doença e quadros depressivos e corrosivos – eram minimizados através da
prática da Arte-terapia, possibilitando a expressão por meio de imagens e
colmatando as dificuldades de comunicação, a afirmação e o reconhecimento de um
espaço terapêutico e de criação de novas dinâmicas relacionais e de integração,
e o uso da criatividade como estratégia de resolver situações.
A Arte-terapia proporciona um espaço destinado à criatividade artística
num contexto relacional e facilitador do desenvolvimento do paciente/indivíduo.
A arte é, desta forma, vista como um exercício de racionalidade, sensibilidade,
emoção e exercício cognitivo, levando a um sentimento de pertença ao mundo, a
si mesmo e ao “outro”. Ao contrário de outros países como o Brasil, a
Inglaterra ou o Canadá, o arte-terapeuta ainda não é uma profissão reconhecida
em Portugal, sendo necessário fomentar o inter-enriquecimento mútuo, validando
uma identidade comum, inerente a uma prática com a finalidade afim que define
um exercício profissional, tal como os artistas são os profissionais da Arte,
independentemente se desenvolvem o cubismo, o surrealismo ou o dadaísmo.
Num ponto de vista mais pessoal e tendo em conta a minha formação
académica de base em Animação Sociocultural, considerei este congresso e as
temáticas aqui abordadas e desenvolvidas de extrema importância e pertinência,
na medida em que as Artes são formas e mediadores de expressão cultural que
podem, por um lado, desenvolver a comunicação (verbal e não verbal) e a
identidade/forma de expressão do próprio indivíduo espontaneamente com e para o
“outro”, assim como aproxima e reconhece diferentes manifestações culturais e
artísticas que nos identificamos na semelhança e diferença com o “outro”, sem
esquecer todos os benefícios inerentes à prática das artes e que foram aqui
nomeadas ao longo desta reflexão.
Referências Bibliográficas
·
APSA –
Associação Portuguesa de Síndrome de Asperger. (2015). O que é a Síndrome de
Asperger? Consultado a 30 de novembro de 2015, em: http://www.apsa.org.pt/sindrome-de-asperger/o-que-e
· PSO
Portugal – Associação Portuguesa da Psoríase. (2015) Psoríase – O que é? Consultado a 30 de novembro de 2015, em: http://www.psoportugal.pt/live/page_reader.php?p=301&t=TyBxdWUgw6k/&g=UHNvcsOtYXNl
· Sociedade Portuguesa de Arte-Terapia. (s.d.).
16º
Congresso Português de Arte-Terapia | Psicoterapia. Consultado a 30
de novembro de 2015, em: http://arte-terapia.com/congresso/